Manifesto no âmbito do processo eleitoral que se aproxima
Motivação para uma intervenção
As instituições de Ensino Superior estão hoje sujeitas a solicitações de mudança determinadas por uma conjuntura complexa a que se somam iniciativas específicas como o processo de Bolonha e o RJIES. No plano interno, o processo de revisão estatutária decorreu sob a expressão “UA em mudança”, que consagra de forma exemplar a importância da fase que atravessamos.
No novo modelo organizacional adoptado pela UA assume papel central a celebração de um contrato programa plurianual com o Estado, que se encontra já desenhado nos seus traços gerais e que estabelece um quadro de referência para os próximos anos. Este contrato corresponde a uma oportunidade única de a UA dar continuidade à construção institucional em que temos estado colectivamente empenhados, com um horizonte temporal invulgar. Este contrato introduz também compromissos muito claros e quantificáveis e um nível de exigência adicional em termos institucionais, constituindo um cenário incontornável para os futuros órgãos de governo da UA.
No âmbito da formação dos novos órgãos de governo, anuncia-se para breve a eleição do Conselho Geral. Concluída esta eleição, o Conselho Geral procederá, no prazo de alguns meses, à escolha da futura equipa reitoral. A proximidade temporal entre ambos os actos justifica uma atenção óbvia em relação à sua estreita interdependência. Espera-nos um caminho difícil e, por isso, um quadro claro de valores de referência deve ser erigido para que se salvaguarde a identidade da UA. Ora, não se trata somente de discutir ideias, temos também de identificar pessoas com provas dadas e motivadas para enfrentar este desafio, procurando mobilizar e preservar a coesão de toda a UA. Por tudo isto adoptámos a expressão «mUdAnça com rumo e com rosto».
Um quadro de valores de referência
Para a actuação dos membros eleitos do Conselho Geral, impõe-se que a identificação dos valores de referência seja complementada por grandes linhas programáticas que correspondam ao quadro da missão e visão para a UA. Neste sentido, delineamos seis valores estruturantes como ponto de partida para a discussão que agora se abre:
1. Autonomia – desenvolvimento e consolidação de actividades de investigação, ensino e cooperação enquadradas por princípios éticos e visando a construção e a afirmação de um pensamento livre e independente, nomeadamente em relação ao poder político e económico.
2. Universalidade - promoção e consolidação das diferentes áreas de conhecimento, da diversidade de níveis, tipos de formação e públicos, dos múltiplos modelos de criação e transmissão de conhecimento e de cooperação com a sociedade.
3. Qualidade - procura permanente de níveis de excelência em todas as actividades, segundo padrões internacionais de elevado e reconhecido mérito, no quadro de políticas institucionais, perseguindo contributos individuais e colectivos visando uma melhoria contínua de desempenho.
4. Inovação - atenção aos sinais de mudança na sociedade, capacidade de a antever, de a influenciar e de se adaptar em relação a esta mesma mudança.
5. Afirmação regional - dinamização de parcerias e redes de cooperação com diversos tipos de agentes (empresas e organizações), tendo em vista o desenvolvimento sustentável da região em que se insere e a afirmação da sua competitividade no quadro das regiões desenvolvidas da Europa.
6. Responsabilidade individual e social - estímulo à construção de um modelo participado de intervenção individual e colectiva, transparente, gratificante e coeso para a comunidade universitária, funcionando como exemplo e agente de progresso da sociedade no seu todo e em todas as suas dimensões.
Um conjunto de linhas programáticas
Um programa para uma eleição para o Conselho Geral deverá traçar linhas directoras que enquadrem o futuro desenvolvimento da UA. Expomos, então, alguns eixos programáticos a enriquecer no âmbito do debate que agora se inicia:
1. Consolidar a diversidade - aperfeiçoar o actual modelo de ofertas formativas (dos CET aos 3ºs Ciclos), tendo em consideração os diferentes tipos de público e a evolução da realidade envolvente, respeitando e reforçando as competências da UA nas diferentes áreas de conhecimento e consolidando a estrutura dual e em rede de unidades de ensino.
2. Coesão institucional - fomentar um modelo de gestão participada baseado na transparência dos actos de gestão universitária, na partilha de informação, na comunicação e na colaboração aberta entre pessoas, unidades e serviços, valorizando os contributos individuais e dos órgãos colegiais; consagrar referenciais claros e motivadores de desenvolvimento de percursos profissionais, apoiar actividades de natureza associativa envolvendo os diferentes corpos e medidas de natureza social, facilitadoras da vida em comunidade.
3. Investigação de excelência - promover medidas de estímulo à melhoria contínua das condições individuais e dos indicadores globais de actividade científica, preferencialmente no quadro de redes de cooperação nacionais e internacionais, visando sempre padrões internacionais de elevado mérito.
4. Aprofundar Bolonha - aperfeiçoar a revisão curricular operada nos últimos anos, com base na avaliação do processo, na exploração de diferentes metodologias de aprendizagem e na utilização racional de recursos, tendo em vista a afirmação de um ensino de excelência com elevados níveis de aproveitamento escolar.
5. Centro de Cultura - reforçar o papel da UA como pólo de criação e divulgação artística e científica, dando particular atenção às acções de cooperação de âmbito regional e criando condições para a sua inscrição num quadro internacional de referência e de vanguarda para a interacção entre arte, ciência e tecnologia, enquanto espaço de atracção e modelo de desenvolvimento e de inovação.
6. Internacionalização e cooperação para o desenvolvimento - estabelecer uma política focada, mas não exclusiva, de parcerias internacionais, com destaque para a Europa, o Brasil, a China e a Índia, encarando a Espanha e o Brasil como elos da relação com a América Latina; desenvolver acções de cooperação, em particular com países e comunidades lusófonas, tendo em vista o apoio na formação de quadros e outras iniciativas visando um desenvolvimento sustentável.
7. Cooperação regional - aprofundar o quadro de relações com diferentes agentes locais, de forma a contribuir para o desenvolvimento regional sustentável, com base no capital institucional de experiência e conhecimento em domínios como a educação, a saúde, a acção social, a cultura, a ciência e a tecnologia.
8. Escola Doutoral - estabelecer um modelo coordenado de funcionamento de programas doutorais atentos às necessidades globais de formação ao nível do 3º Ciclo, reforçando laços de cooperação nacional e internacional numa lógica de afirmação da UA como centro competitivo de recrutamento de estudantes de pós-graduação de elevado nível.
9. Pólo de Ciência e Tecnologia - participar na construção de um Parque de Ciência e Tecnologia em cooperação com os agentes económicos e as autarquias, aproveitando as oportunidades criadas pelas políticas de inovação nacionais e europeias, tendo por objectivos a qualificação do tecido económico regional, a atracção de parceiros industriais estratégicos e a inserção da investigação da UA na construção da sociedade do conhecimento e de uma economia de serviços.
10. Gestão da qualidade - promover uma cultura de responsabilização individual e colectiva, adoptar práticas de avaliação de desempenho ajustadas às diferentes áreas de conhecimento, tendo em vista o diagnóstico e a promoção de acções tendentes a ultrapassar necessidades de desenvolvimento pessoal e a adaptar os modelos de organização e funcionamento de todas as unidades e serviços a uma lógica de melhoria contínua.
11. Campus Aberto - preservar e promover a abertura do Campus à comunidade, afirmando-o como símbolo de um ambiente de grande qualidade, também espaço de lazer e exemplo de boas práticas de gestão ambiental e energética.
12. Ser e servir a comunidade - explorar as novas hipóteses de flexibilidade de gestão de recursos materiais e humanos e de relacionamento com entidades externas, tendo em vista o reforço da autonomia institucional, a criação de um ambiente motivador e gratificante, para todos os corpos da comunidade universitária, e o reforço de uma lógica de serviço público.
Um perfil para a equipa reitoral
A proximidade entre o processo de eleição para o Conselho Geral e a eleição do futuro Reitor justifica uma clarificação do perfil recomendável para uma equipa reitoral. Perante uma conjuntura particularmente difícil, que exigirá grande coesão e mobilização da comunidade universitária, destacam-se os seguintes valores:
§ prestígio na comunidade académica, em particular no domínio da investigação, este tendo um papel crítico no alargamento do financiamento institucional e no cumprimento de objectivos do contrato programa;
§ experiência em funções de gestão universitária, incluindo unidades orgânicas e de investigação, órgãos gerais de governo e coordenação, e na intervenção em soluções inovadoras no quadro destas funções;
§ respeito pela diversidade científica, formativa e orgânica da UA e pelas diferentes sensibilidades e expectativas no âmbito da comunidade universitária;
§ conhecimento da realidade da UA, das instituições onde a UA exerce influência directa e ainda das entidades externas com as quais a UA tem relações particularmente estreitas.
Os desafios que a UA enfrenta exigem a mobilização e a participação de toda a comunidade na continuação de um processo de «mUdAnça com rumo e com rosto».
4 comentários:
Como proceder para subscrever este manifesto? Este procedimento não está claro quando consultamos este blog.
Cara Colega
O comentário sobre a subscrição do blogue é muito pertinente. Pensamos que o problema está resolvido.
Gostaria de congratular os colegas que criaram este blog para promover a discussão e divulgação de ideias sobre as eleições e as mudanças que se perspectivam na UA.
O manisfesto Mudança Com Rumo e Com Rosto apresenta ideias importantes, mas, pela própria natureza do manifesto, são genéricas. Acho que o quadro dos valores de referência mostra uma preocupação importante com a qualidade e saúdo esta iniciativa, que me parece importante e que comento abaixo. Como biólogo, as minhas preocupações e comentários poderão parecer focalizadas nas ciências da vida, e poderão de facto não ser muito relevantes em certas áreas, mas tentarei ser tão abrangente quanto possível.
Entendo que a vida académica exige rigor e excelência no ensino e na investigação e que as instituições académicas devem ter mecanismos justos e transparentes de valorização do mérito e da excelência. É surpreendente a falta de tais mecanismos no nosso ensino superior. Continuamos a avaliar e a promover os docentes pela quantidade de publicações sem atendermos à qualidade das mesmas. A nível internacional (em muitas instituições), a produtividade científica (número total de publicações) contribui com ~30% e a qualidade (5-10 melhores publicações) com ~70% para a avaliação global do CV. No mérito científico, deveríamos incluir: i) a capacidade dos docentes para atrair fundos nacionais e internacionais para a investigação, em concursos competitivos com arbitragem internacional independente: ii) a sua capacidade para criar programas de investigação autónomos e promover a formação pós-graduada experimental de elevada qualidade. Surpreende-me também a não valorização (ou a pequena valorização) curricular de: i) apresentações orais, por convite ou por selecção de abstracts; ii) coordenação de simpósios em conferências internacionais de referência em cada área científica. Já para não falar na pouca importância que é dada aos prémios científicos de mérito.
A questão dos mecanismos de promoção da qualidade também se coloca a outros níveis. É surpreendente que as nossas universidades contratem novos docentes e lhes atribuam serviço docente sem se preocuparem com a sua preparação científica e pedagógica. Assume-se que o doutoramento e os pós-doutoramentos (quando existem) dão a formação necessária para as tarefas que lhes são atribuídas. O contraste com as instituições internacionais de referência não podia ser maior. Estas, preocupam-se em assegurar aos novos contratados as condições necessárias para iniciarem a sua investigação, dando-lhes espaço laboratorial e uma verba para arranque da sua investigação, bem como um serviço docente mínimo (10-20 horas / ano) nos 3 primeiros anos, que vai depois aumentando gradualmente ao longo do tempo. Outra diferença: tais instituições são exigentes na renovação dos contratos após 5 anos (nomeação definitiva). Esta questão está associada a outra muito importante, nomeadamente, os mecanismos de contratação de docentes. As nossas instituições são “endogâmicas”, e não se tem verificado progresso na implementação de medidas de combate a tal endogamia. Há aqui progresso significativo a fazer.
Por outro lado, ao nível da investigação, espera-se que os docentes criem grupos de sucesso e que publiquem nas melhores revistas, mas não se lhes dá formação, por exemplo, na gestão/management de grupos de investigação nem na escrita de artigos científicos e projectos de investigação. Uma coisa é escrever um artigo para uma revista de baixo factor de impacto, outra bem diferente é escrever para uma revista de elevado factor de impacto, ou ter sucesso como investigador principal num concurso competitivo para financiamento de projectos de investigação. Finalmente, as nossas instituições não fazem rigorosamente nada para promover a sua investigação junto dos editores das revistas científicas de referência ou das agências financiadoras da investigação. Julgo que a contribuição financeira dos projectos de investigação para o orçamento das instituições, e em particular os 20%-40% de overheads, justificam uma postura mais activa das instituições na promoção da sua investigação.
22 de Abril 2009
Manuel A. S. Santos
Prof. Associado - Biologia
Caro Colega
Muito agradecemos o seu contributo. Brevemente contamos publicar algumas reflexões sobre as questões que aqui coloca. Contamos com a sua colaboração para a discussão!
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